14.8.06

>> Por votos, políticos propõem 86 novas universidades federais.

Especialistas em emendas para agradar suas bases eleitorais, deputados e senadores descobriram, nos últimos três anos, um novo filão: os projetos de lei que autorizam a criação de universidades federais. Desde o primeiro ano do governo de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2003, o número de propostas tramitando no Congresso explodiu. Chegaram a 92 em 2006, sendo que 6 já foram aprovadas. Nos oito anos anteriores, do governo Fernando Henrique Cardoso, foram apenas oito.O número de projetos foi crescendo devagar e sempre, e atingiu o auge em 2005. Em 2003, quando o governo Lula ainda tinha apenas anunciado a intenção de expandir o sistema federal de ensino, foram 13. Em 2004, pularam para 20. No ano seguinte, alcançaram 39. Este ano, são 20 somente até julho. Neste segundo semestre, como as atividades no Congresso diminuem por conta das eleições, o ritmo de propostas tende a cair.

O súbito interesse dos parlamentares por novas universidades federais tem o objetivo de se contrapor à intenção do governo Lula de criar novas instituições por conta própria. Desde que assumiu, o presidente lançou um plano ambicioso para aumentar as vagas no ensino superior. O plano prevê a abertura de quatro novas universidades e 48 projetos de unidades para instituições já existentes (ver texto ao lado). No plano de governo para um segundo mandato, novas instituições e expansões estão planejadas."Há tempos não se criavam novas instituições. A decisão do governo despertou o interesse dos parlamentares", admite a deputada Neyde Aparecida (PT-GO), presidente da Comissão de Educação da Câmara.

Para a educadora e secretária de Ciência e Tecnologia de São Paulo, Maria Helena Guimarães de Castro, a expansão do governo está sendo feita sem critérios, porque era preciso reformar antes o modelo de instituições públicas e de gestão das federais."Com que dinheiro vão sustentar mais universidades se hoje o MEC já gasta, de cada R$ 100 da educação, R$75 com as universidades? Como fica o discurso de que a prioridade tem que ser a qualidade da educação básica?" Para ela, seria mais útil para o País fazer investimentos na criação de cursos tecnológicos e técnicos.A deputada Neyde não está entre os que apresentaram projetos para seu Estado, mas Goiás é o campeão de propostas. Existem 12 pedidos para o Estado, incluindo instituições na Chapada dos Veadeiros e duas no entorno do Distrito Federal.

Hoje, Goiás possui uma universidade federal e três Centros Federais de Educação Tecnológica (Cefets).São Paulo aparece ao lado de Goiás, também com 12 pedidos. O Estado tem a maior bancada de parlamentares e um dos menores números de vagas em universidades federais.Minas está em quarto lugar na lista de pedidos, com sete propostas feitas por sua bancada estadual. É, certamente, o Estado que menos precisa de instituições federais de ensino superior. Tem nada menos que 11 universidades, sete faculdades de tecnologia e seis Cefets com ensino superior. É o mais bem servido entre os Estados da Federação.Das 92 propostas totais, as seis aprovadas foram apresentadas pelo Executivo. As instituições já começaram a ser implementadas, como a Universidade do Grande ABC, em São Paulo, que divulgou a lista de aprovados em seu vestibular neste mês, e a de Campanha, no Rio Grande do Sul.

IMPROVÁVEIS
O surto de criação de universidades envolve parlamentares de todos os partidos, do PT ao oposicionista PFL, e de todo o País. Cada um tenta garantir uma nova instituição para seu reduto eleitoral, embora a chance de concretização dos projetos seja pouco provável. Isso porque as propostas dos parlamentares só podem dar autorização ao governo. Ou seja, o Executivo não tem obrigação de cumpri-las.Mesmo assim, alguns parlamentares são insistentes. O campeão é Inocêncio Oliveira (PL-PE), que apresentou nada menos que cinco projetos nos últimos três anos, criando as mesmas instituições, na Zona da Mata e no sertão pernambucano.

Procurado pelo Estado, Inocêncio não foi encontrado. Está em campanha justamente nessas duas regiões."Os projetos funcionam como uma mobilização. Se os deputados não fizerem isso, como o presidente vai ficar sabendo de suas reivindicações?", diz a deputada Neyde. Por isso, muitos não se dão ao trabalho de fazer um projeto de lei. Contentam-se com uma indicação - uma sugestão ao Executivo - para criar uma universidade. Além dos projetos, já existem mais de 150 indicações no Congresso.A chance de as instituições saírem do papel é mínima.

O Ministério da Educação (MEC) prevê, em suas propostas de expansão, um investimento inicial de R$ 8 milhões para cada uma das instituições que está criando - isso sem contar o aumento da despesa permanente de custeio, com salários de professores, funcionários e gastos gerais. Atualmente, o orçamento das federais é de R$ 8,6 bilhões.Descontando já os projetos repetidos - deputados tendem a apresentar as mesmas propostas que seus colegas quando têm bases eleitorais semelhantes -, se o ministério acatasse todas as propostas, teria de investir cerca de R$ 600 milhões somente nas instalações das novas instituições.

O número de propostas no Congresso surpreendeu o ministro da Educação, Fernando Haddad. Mas, apesar de achar estranho que os deputados tenham encontrado tantos lugares para criar novas instituições, ele afirma que isso não vai influenciar o projeto de expansão preparado pelo MEC."Nosso projeto de expansão leva em conta análises de necessidades regionais feitas pelo governo. Não há influência dos projetos do Congresso", afirma o ministro.

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